Wednesday, November 11, 2009

Efeitos das agressões na saúde física e mental

Portugueses lideram projecto europeu sobre violência doméstica

A Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) vai liderar um projecto europeu inédito sobre violência doméstica – o DoVE (Domestic Violence against Women/Men in Europe: Prevalence, determinants, effects and policies/practices), financiado em um milhão de euros pela Agência Executiva para a Saúde e para os Consumidores, um órgão ligado à Comissão Europeia.

A iniciativa tem como objectivo avaliar a prevalência desta tipo de violência na Europa, caracterizar os actos de abuso, as vítimas e os agressores, e analisar os efeitos da violência conjugal na saúde física e mental dos lesados. Trata-se de um projecto de grande dimensão, que inclui equipas multidisciplinares de oito países da União Europeia, e cujos resultados deverão ser conhecidos dentro de dois anos.
O trabalho vai culminar na redacção de recomendações adaptadas à realidade da europeia, que serão entregues às autoridades competentes com o objectivo de promover a adopção de medidas mais eficazes contra este problema.

A violência doméstica é um flagelo que atinge tantos os países em desenvolvimento como as nações e as populações mais privilegiadas. Em Portugal, estima-se que um terço das mulheres já tenha sido vítima numa das suas diferentes formas (física, sexual e psicológica).

Há casos não reportados

A maioria dos estudos sobre este problema focaliza-se no sexo feminino cujos dados advêm dos registos criminais e queixas formais ou dos pedidos de apoio das vítimas às instituições especializadas. Ficam de fora todos os casos não reportados bem como situações em que a vítima é um homem.
O DoVE pretende avaliar uma amostra representativa da população adulta de cada um dos países envolvidos (Portugal, Suécia, Alemanha, Reino Unido, Bélgica, Espanha, Grécia e Hungria), tanto nas mulheres como nos homens.

Perspectiva científica
Cientistas pretendem estudar os actos de violência praticados entre parceiros íntimos, independentemente do estado civil ou género, com recurso a instrumentos estandardizados. É esta perspectiva científica mais abrangente e neutra que distingue este trabalho de outros existentes sobre a violência doméstica em Portugal.
De acordo com Henrique Barros, director do Serviço de Higiene e Epidemiologia da FMUP e líder do DoVE, os trabalhos científicos existentes são escassos. Os resultados de um trabalho anterior sobre este tópico, desenvolvido para a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, demonstram que uma em cada três mulheres portuguesas já foi vítima de abusos por parte do parceiro.

Em muitas situações a vítima é o homem

Um outro estudo da Universidade do Minho, realizado no Norte de Portugal sobre a prevalência da violência entre parceiros íntimos, demonstrou que 26,2 por cento dos participantes declararam ter cometido pelo menos um acto abusivo contra o seu parceiro no último ano, contando qualquer tipo de abuso. Mas há muito por explorar.
Esta é a primeira vez que se avaliam os efeitos da violência doméstica em termos de saúde física e mental. Sabe-se que é recorrente que as vítimas deste tipo de abuso sofram de depressão, ansiedade, stress pós-traumático, etc. Mas não existem trabalhos que relacionem os abusos e a deterioração da saúde das vítimas no nosso país.

Indicadores de abusos

Os investigadores vão procurar também indicadores da prática destes abusos. Aos inquiridos será perguntado se bebem, consomem drogas, se foram vítimas de agressões durante a infância ou se assistiram a cenas de violência entre os progenitores, entre outras coisas, que se sabem estar associadas à prática de violência doméstica. O estabelecimento destes indicadores tem um papel fundamental, servindo de sinal de alerta aos profissionais de saúde e às autoridades que passam a poder detectar os casos mais precocemente.
Paralelamente, a investigação pretende reunir, analisar e comparar a legislação e práticas profissionais de cada país no que toca a medidas de prevenção, detecção e reabilitação de vítimas e agressores. A comparação desses dados entre os diferentes países envolvidos no projecto vai permitir fazer algumas leituras sobre o efeito que diferentes tipos de medidas têm sobre a prevalência da violência doméstica e elaborar propostas que visem a sua melhoria.
Em Portugal, existe legislação sobre violência doméstica desde 1991. Em 2008, a PSP e a GNR registaram 27 mil queixas referentes a casos de violência doméstica.


Violência doméstica supera crimes na estrada



Registo de inquéritos diminuiu este ano na Grande Lisboa e Ilhas, mas são mais os crimes de violência doméstica do que ao volante.

Um caso de violência doméstica em Rio Maior levou um homem a sequestrar a mulher e os filhos. O alegado agressor barricou-se em casa foi cercado pela polícia, acabando detido.A mulher e os filhos escaparam.
Este crime registado em Março foi um dos 8336 inquéritos de violência doméstica iniciados pela Procuradoria Geral Distrital de Lisboa (PGDL) nos três primeiros trimestres deste ano. Mais do que os relacionados com as infracções rodoviárias (7252). Em Portugal praticam-se mais crimes na família que ao volante da viatura.
Contudo, o último relatório da PGDL, a que o DN teve acesso, revela que está a diminuir o número de processos-crime na zona de influência daquela procuradoria, que inclui Açores e Madeira, onde se regista quase 50% de toda a criminalidade praticada em Portugal. Nos três primeiros trimestres deste ano, iniciaram-se 154 944 processos enquanto que em período homólogo de 2008 foram 166 900.
"Dos 154 944 iniciados no conjunto dos três trimestres, 75 165 foram contra desconhecidos, e 79 779 contra conhecidos, representando aqueles 48% da criminalidade registada (contra 30,5%, equivalentes a 51 032 inquéritos, em igual período do ano passado)", refere a PGDL. Assim, verifica--se que quase metade dos crimes não têm rosto, o que significa o arquivamento da maioria. Aliás, só este ano já foram arquivados cerca de 129 mil inquéritos, um pouco menos do que em período homólogo do ano passado.
Mas, apesar de diminuírem os processos-crime, a pendência (inquéritos atrasados) tem vindo a aumentar. Comparando-se os dois períodos, passaram de 90 705 para 93 104. Isto resulta do facto de terem sido menos os processos terminados do que os iniciados. "Foram findos 149 453 inquéritos, menos do que no ano de 2008, em que findaram, em igual período, 156 993 inquéritos", referiu a entidade que administra o Ministério Público na Grande Lisboa e Ilhas.
A criminalidade contra o património (roubos e furtos) continua destacada nos inquéritos registados, já que totaliza 81 322 dos novos inquéritos, ou seja, 52,48% dos inquéritos do período. A variação relativamente ao período idêntico no ano anterior tem significado visto que, em 2008, entraram 96 930 inquéritos contra o património, que representaram então 58,1% da criminalidade registada.
Os demais segmentos têm as seguintes variações: crimes contra as pessoas foram agora 32 392, contra os 32 527 em 2008; crimes contra a vida em sociedade foram 9143 contra 9678; crimes contra o Estado, 3431 contra 3915; cheques sem provisão, 1780 contra 3625; crimes de tráfico de estupefacientes, 2035 contra 2113.
Analisando mais especificamente o fenómeno criminal, verifica-se que este ano foram praticados mais crimes de violência doméstica (8336) do que por condução sem habilitação legal, sob efeito do álcool, ou outras infracções rodoviárias (7252). Relativamente a crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores iniciaram-se este ano 638 inquéritos.

Monday, October 19, 2009

Redução passa por envolver escolas, igrejas e até cabeleireiros

por Sílvia Maia, Lusa


A redução dos casos de violência doméstica passa por programas curriculares nas escolas e conversas nas igrejas e até nos cabeleireiros de bairro, defende uma especialista norte-americana, que apela às vítimas que contem as suas histórias, sem vergonha.
Em entrevista à agência Lusa, Susie Johnson falou da longa experiência dos Estados Unidos no combate à violência doméstica, um crime que tem obrigado 16 mil mulheres a procurar diariamente serviços de apoio e 24 mil mães e crianças a saírem de casa à procura de um abrigo.
Em Portugal, a violência doméstica leva todos os dias mais de 70 mulheres às esquadras da PSP e GNR. Mas muitas outras continuam a viver em silêncio um crime cujos efeitos psicológicos só "são comparados aos de um atentado terrorista", compara a presidente da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, Teresa Féria.
Para Susie Johnson, que esteve em Portugal para participar num colóquio organizado pela Escola Superior de Enfermagem, em Lisboa, as leis "já estão todas escritas", agora é preciso alterar mentalidades. E esse trabalho tem de ser feito com a ajuda das vítimas.
"As mulheres têm de deixar de ter vergonha, porque não é culpa delas terem sido vítimas de violência doméstica. Têm de se levantar e dizer publicamente 'eu fui violentada', para que outras mulheres sintam segurança em fazer o mesmo", defende.
"Nós sabemos que contar as histórias ajuda outras mulheres, porque há uma identificação. As vítimas são grandes especialistas nesta matéria e devem estar envolvidas nos programas para que se tornem mais eficazes. Não basta falar com estudiosos e especialistas das universidades", destaca.
Mas para isso acontecer é preciso que a sociedade perceba que a culpa não é da vítima. É preciso transformar as normas culturais, porque são elas que aprisionam as mulheres.
Nos Estados Unidos, existem programas curriculares que já tratam a questão da violência. "Temos de começar pelas crianças. Nas escolas, as raparigas aprendem a respeitar-se e os rapazes aprendem o que é ser um homem, para lhes mudar as definições sobre autoridade, as normas que definem o papel da mulher e as expectativas. Desde pequenos aprendem o significado do que significa viver num mundo sem violência", exemplifica Susie Johnson.

Mas não é só nas escolas que se deve trabalhar. "Nas igrejas, nos cabeleireiros, em reuniões com pequenos grupos de mulheres, toda a comunidade tem de se envolver, porque esta não é uma questão do domínio privado da mulher mas sim de todos", realça.
Susie Johnson lembra que é necessário haver "condições que permitam às mulheres ter liberdade para reportar o abuso com a certeza de que quando o fazem existem sistemas e espaços que garantam a sua segurança e a das crianças".

Em Portugal existem mais de três dezenas de casas-abrigo, mas as instituições reconhecem que esta solução só é proposta em situações extremas.
Nos encontros com responsáveis que lidam com a violência doméstica, Susie Johnson avaliou que "as organizações respondem lindamente aos problemas, mas ainda estão no início".
"Para reduzir os números de maus-tratos e reduzir os casos de mulheres que denunciam os crimes e se transformam em números de homicídios, é preciso trabalhar para salvar vidas. É preciso apostar na prevenção para mudar os números horríficos, que são uma realidade que tem de parar de crescer", aconselha.
De acordo com a especialista, nos EUA a cada 14 segundos uma mulher faz uma chamada para um número de ajuda e uma em cada três mulheres que vão parar às urgências foram vítimas de violência doméstica.
Em Portugal os números sobre homicídios são díspares. Dados do último relatório do Ministério da Administração Interna falam em pouco mais de 20 mortes no ano passado, enquanto a União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) garante que pelo menos o dobro das mulheres passou a fazer parte das estatísticas dos homicídios no país, ou seja, mais de 40.
Susie Johnson deixou um alerta: "Uma em cada três mulheres é vítima de violência ao longo da sua vida, mas apenas metade denuncia a situação."

Queixa só é feita após 35 episódios de agressão

Só metade das mulheres denuncia ser vítima de maus-tratos e, em média, a queixa só é feita após 35 episódios de agressão, revelou à Lusa uma especialista norte-americana.

A maioria dos crimes ainda é silenciada por mulheres que vivem aterrorizadas por aqueles que amaram.
Maria (nome fictício) tinha entrado nas urgências e estava na ginecologia quando disse que não queria ter alta. As enfermeiras estranharam, mas não disseram nada. Não se queriam meter na vida da paciente. Maria acabou por desabafar que era vítima dos maus-tratos do marido e tinha medo de regressar a casa. O caso foi revelado esta semana por uma enfermeira, durante um colóquio sobre violência doméstica que decorreu na Escola Superior de Enfermagem, em Lisboa.
Mas esta é apenas uma história de um crime que atinge milhares de mulheres. Todos os dias, em Portugal, as forças de segurança registam 76 novos casos de maus-tratos. E, regra geral, quando ali chegam, as vítimas já passaram por um longo processo de humilhação e subordinação.
"Os estudos indicam que as mulheres só denunciam a situação depois de 35 ocorrências", disse à Lusa Susie Johnson, responsável pela Secção para as Mulheres do Washington Office of Public Policy (Estados Unidos), que conta com um milhão de sócias.
A demora em delatar o crime tem várias razões. Além do medo, "normalmente o agressor é o homem em quem sempre confiaram e que amaram e, muitas vezes, é o pai dos filhos", explica a presidente da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas (APMJ), Teresa Féria.
"Se, por um lado, têm medo de que possa voltar a acontecer, também têm a esperança de que as coisas vão mudar. Há todo um relacionamento e carga afectivos envolvidos", acrescenta João Lázaro, secretário-geral da Associação Portuguesa de Apoio à Vitima (APAV).

"Muitas vezes, o crime perpetua-se durante anos e anos", sublinha, frisando que, apesar de actualmente existir menos estigma social sobre quem se assume como vítima, ainda "há casos de mulheres que estão assim durante 10, 15 anos ou mesmo 17 anos".
O ciclo de violência tem normalmente três fases: começa pela violência física ou psicológica, depois segue-se a fase da lua-de-mel, em que a vítima acredita no agressor, e finalmente a fase da tensão, quando começa uma clara perseguição que vai levar ao crime.
"Na psicologia, estas mulheres estão classificadas tal como as vítimas de atentados terroristas", compara a presidente da APMJ, explicando que nem as violações que ocorrem na fase adulta têm tanto impacto psicológico. A razão é simples: o agressor é normalmente um desconhecido.


Apesar da violência do crime, a percentagem de casos que sobe às barras dos tribunais é ínfima.

Segundo os dados do Relatório Anual de Segurança Interna de 2008, do Ministério da Administração Interna, divulgados em Março, as forças policiais registaram uma média de 2312 queixas mensais.
Apesar de haver mais de 20 mil queixas por ano, apenas uma em cada dez mulheres avançou com um processo no ano passado. Mas os números mostram uma evolução: as acusações em tribunal duplicaram nos últimos dois anos, passando de 1033 em 2007 para 2420 em 2008, assim como as condenações, que passaram de 526 para 1154.
Uma das razões que leva as mulheres a permanecerem no silêncio prende-se com a falta de confiança no sistema judicial e de segurança, defende Elisabete Brasil, da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR).
Teresa Féria lembra um estudo espanhol que indica que no país vizinho "morre-se muito durante o período entre o processo e a audiência do agressor".
Mas há muitos casos que nem chegam à fase de acusação porque não se consegue prova. "São crimes que se passam entre quatro paredes, não há testemunhas. Há agressores que não permitem que as vítimas recorram aos hospitais ou a outros serviços de saúde. Trancam-nas em casa, ameaçam-nas nos dias posteriores", lembra Elisabete Brasil.

Para Susie Johnson, é preciso sensibilizar e envolver toda a sociedade para que este deixe de ser um crime escondido. Até porque, alerta, "uma em cada três mulheres é ou vai ser vítima de violência num momento da sua vida".

Wednesday, October 14, 2009

Violência contra as Mulheres

A caminhada da emancipação feminina ao longo da História, da total subordinação face ao homem até à luta pela igualdade de género, a conquista de direitos, as suas causas e implicações e as bases conceptuais e teóricas da violência exercida contra a mulher vão estar sob análise no primeiro curso Interdisciplinar de pós-graduação em «Violência contra as Mulheres no seio da Família», que arranca depois de amanhã, na Escola de Direito do Centro Regional do Porto da Universidade Católica Portuguesa (UCP).

O curso, inédito no país, e que resulta de uma parceria entre a UCP e a Associação Portuguesa de Mulheres Jurídicas, é direccionado para licenciados em Direito, Psicologia, Sociologia, Medicina, Enfermagem ou Serviço Social que actuem directa ou indirectamente na área da violência contra as mulheres no seio da família.
Coordenada por Maria Clara Sottomayor e Maria Teresa Féria de Almeida, esta formação tem como objectivo principal dotar os formandos de maior competência para lidar eficazmente com as situações de subjugação e de confronto que diariamente atingem milhares de mulheres, tocando a Filosofia, a História, o Direito, a Saúde e a Psicologia.
Com uma metodologia assente no estudo de casos e na exposição temática que sustenta os seus nove módulos e a realização de 16 sessões que decorrem até dia 11 de Dezembro, aborda temas como a história das mulheres, o enquadramento jurídico da violência contra o sexo feminino, o Direito Penal e o Processo Penal, o Direito da Família, o Direito do Trabalho, o Direito da Segurança Social, os cuidados de saúde e a caracterização psicológica das relações violentas, bem como o objectivo e o esquema de funcionamento das casas que oferecem abrigo às vítimas deste crime.

Para efeitos de aprovação, cada formando terá de responder a um exame escrito na área do Direito e apresentar um trabalho abrangendo uma das outras áreas temáticas abordadas nas sessões.

Friday, March 6, 2009

"É a minha mulher, saia daqui senão mato-a a seguir"

Vítima, de 49 anos, saiu de casa e foi perseguida pelo homicida, que ameaçoude morte moradores que assistiram ao crime, em Cabeças (Alvaiázere)
00h32m
HELENA SILVA, COM N.M. E A.S.
Foram minutos de verdadeiro terror a que assistiram alguns moradores da localidade de Cabeças. Uma mulher foi esfaqueada até à morte, no interior do seu carro. O suspeito é o ex-marido da vítima.
Maria Manuela Reis Antunes Margarido, de 49 anos, saíra de casa, no lugar de Casais de Arega, Figueiró dos Vinhos, pouco antes das 9 horas. Entrou no carro e dirigia-se para o emprego, numa churrasqueira daquela vila, quando detectou um automóvel a segui-la. Terá sido isso que a levou a alterar a rota e, em vez de seguir pela Estrada Nacional 350 - que a levaria ao centro da vila - tomou o desvio para o lugar de Cabeças. Na pequena localidade, tomou uma rua estreita e ainda entrou com o carro (um Opel Corsa de cor branca) no alpendre de uma casa.
Delfina Lopes, de 61 anos, a proprietária da habitação, estava a ver televisão, no primeiro andar, e ouviu o barulho do carro a chegar. Desceu para tentar perceber o que se estava a passar e foi confrontada com uma imagem de horror.
"Ele [o agressor] estava de joelhos por cima dela, que estava deitada nos bancos da frente do carro. Tinha uma faca na mão e estava a esfaqueá-la", contou ao JN mulher, visivelmente chocada.
Foi nessa altura que a sexagenária se apercebeu de que Maria Manuela gritava desesperadamente. "Ela dizia: "acudam-me, acudam-me", relatou.
Sem pensar bem no que fazia, a mulher correu em seu auxílio. Pela porta da frente do veículo, que se encontrava aberta, segurou o braço do homem, enquanto gritava: "O que está a fazer? Deixe a mulher". Conta a moradora que o homem parou por momentos, voltou-se para ela e berrou: "Saia já daqui, senão vai a seguir. Esta é a minha mulher".
Delfina diz ter corrido, então, para casa de uma prima, de onde telefonou a alertar as autoridades. Quando regressou ao local, o homem estava a fugir de carro, em marcha-atrás. "Ainda espreitei para dentro do carro, mas ela já nem se mexia. Estava cheia de sangue. Estava morta", afirma, procurando segurar as lágrimas. "Se calhar, eu podia ter feito mais alguma coisa para a ajudar", lamentava.
Ontem, ao final do dia, a Polícia Judiciária de Coimbra ainda procurava o agressor, que se supõe tratar-se do ex-marido da vítima.
Maria Manuela saíra de casa do marido, na zona da Barquinha, há cerca de um ano. E regressara a casa dos pais, em Casais de Arega. Os moradores daquela localidade contam que, por várias vezes, a mulher se queixara da perseguição e das ameaças de que era alvo por parte do ex-marido.
"Ele dizia que a matava e costumava andar por aqui, muitas vezes, a espiá-la. Até de noite, ele ficava por aqui, dentro do carro", contou um dos habitantes.
Anteontem à noite, o carro do ex-marido foi visto por alguns moradores, próximo do adro da igreja de Arega. Por isso, acreditam que ele terá ali ficado toda a noite e tê-la-á seguido pela manhã. Contam ainda os moradores que a mulher terá apresentado queixa e que estaria agendada, para ontem, uma audiência em Tribunal relativa a essas queixas.
Crime deixa aldeira chocada
"Chamem a guarda"
Manuel Graça, de 70 anos, diz que ainda viu o agressor antes dele fugir. E assegura que as últimas palavras do alegado homicida, foram: "Chamem, agora, a Guarda".
Filho reconheceu corpo
Todos os documentos da vítima desapareceram do carro. A polícia acredita que tenham sido levados pelo agressor. O cadáver da mulher foi levado para morgue do Hospital de Avelar, onde foi reconhecido pelo filho, de 29 anos.
Desempregado
Os moradores de Arega contam que o ex-marido da vítima se encontrava desempregado, depois de alguns anos a trabalhar no estaleiro de uma empresa, na zona da Barquinha.