Wednesday, October 24, 2007

Moçambique: Fórum Mulher quer legislação sobre violência doméstica, discussão adiada pelo parlamento

24 de Outubro de 2007, 14:44
Lisboa, 24 Out (Lusa) - O Fórum da Mulher Moçambicana considerou hoje essencial a existência de uma legislação que proteja as vítimas de violência doméstica, discussão adiada várias vezes pelo parlamento.
Segundo a Afrol News (agência noticosa africana), o Fórum da Mulher, instituição de defesa dos direitos da mulher moçambicana, elaborou há cerca de um ano uma lista de recomendações, na qual apelava ao parlamento para que discutisse um projecto sobre a violência domestica, realidade que afecta homens, mulheres e crianças do país.
Como a discussão tem estado ausente da ordem dos trabalhos, o Fórum Mulher chamou mais uma vez atenção do parlamento para a ausência de legislação sobre essa matéria, aproveitando a campanha internacional 16 Dias de Activismo Contra a Violência no Género, que se realiza anualmente entre 25 de Novembro e 10 de Dezembro.
Embora não exista uma lei específica sobre violência doméstica, a polícia pode actuar de acordo com as disposições do Código Penal e do direito da família, mas estas não abordam as necessidades específicas deste tipo de maus-tratos.
Um relatório divulgado em Junho sobre violência doméstica em Moçambique dava conta de um aumento, em 2006, do número de homens que se queixavam de abusos por parte das mulheres.
Em 2006, 767 homens apresentaram queixas contra as mulheres, representando um aumento de 57 por cento face ao ano anterior.
De acordo com o relatório, no ano passado foram denunciados 2.709 casos de violência doméstica contra os 2.365 apresentados em 2005.
A taxa de resolução foi idêntica em 2005 e 2006, quando foram solucionados menos de 50 por cento dos casos.
Em 2006 foram resolvidas 1 333 queixas, enquanto no ano anterior 1 222.
A maior parte dos países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) não têm legislação própria sobre violência doméstica, à excepção da África do Sul, Namíbia e Ilhas Maurícias.
CMP.

Thursday, October 18, 2007

AR: Diploma do BE contra a violência doméstica regressa à comissão após críticas do PS

18 de Outubro de 2007, 19:05

Lisboa, 18 Out (Lusa) - Um projecto de lei do Bloco de Esquerda para o combate à violência de género vai regressar à comissão de Assuntos Constitucionais para reapreciação, depois de a maioria PS ter criticado em plenário a proposta.
O projecto de lei prevê a criação de "unidades especiais" nos tribunais para acompanhar os processos de violência doméstica, a perda de apoios sociais aos agressores, o acesso imediato das vítimas ao Rendimento Social de Inserção, e sistematiza o conjunto de medidas já em vigor para o combate à violência de género.
No debate parlamentar, todas as bancadas se disponibilizaram para viabilizar a discussão do projecto de lei em sede de comissão, mas a deputada do PS Paula de Deus dirigiu fortes críticas ao projecto no que foi entendido pelo BE como um sinal de rejeição na votação, prevista para hoje.
Nesse sentido, o BE decidiu propor que o projecto não fosse votado e regressasse à comissão de Assuntos Constitucionais para reapreciação.
No debate, a deputada do BE Helena Pinto defendeu que o diploma se centra no combate à violência contra às mulheres "por serem mulheres" e defendeu que a criação de unidades especiais nos tribunais permitiria "uma especialização dos magistrados e de todos os agentes judiciais".
"Chega-se ao cúmulo de o tribunal saber que uma mulher está acolhida num centro e mesmo assim determina visitas do agressor aos filhos, nesse mesmo local", disse.
Sem se referir à criação de unidades especiais nos tribunais, a deputada socialista Paula de Deus destacou que a protecção das vítimas já tem o seu quadro legal instituído e que o PS e o Governo "estão a trabalhar" na execução das estratégias de combate à violência doméstica.
"O projecto do BE não tem oportunidade na agenda da sociedade portuguesa", argumentou, considerando que, "qual Bela Adormecida, só agora o BE acordou para o problema".
Outras disposições, como a proibição de referências consideradas sexistas nos manuais escolares ou o apoio social às vítimas já estão previstos na lei em vigor, que a deputada do CDS-PP Teresa Caeiro lamentou ainda não estar regulamentada nem aplicada na totalidade, apesar de ter sido aprovada há vinte anos.
O projecto foi saudado pelo PEV por incluir "inovações" no combate à violência de género, sobretudo em matéria judicial.
O deputado comunista Bernardino Soares, considerou a proposta construtiva numa altura em que o novo Código de Processo Penal teve o efeito de "permitir o acesso dos arguidos em processos de violência doméstica terem mais cedo acesso aos processos", "desprotegendo a vítima".
O deputado do PSD Mendes Bota admitiu igualmente a aprovação do diploma, apesar de dúvidas quanto à constitucionalidade da criação de unidades especiais nos tribunais uma vez que a Constituição da República "atribui o exercício da acção penal" em exclusivo ao Ministério Público.
SF.
Lusa/Fim

Tuesday, October 2, 2007

Leis que interessa conhecer


Combater a violência doméstica é combater um fenómeno que contraria os princípios fundamentais do Estado de direito, a que urge pôr termo. É esse o principal objectivo deste II Plano Nacional contra a Violência Doméstica


Garante protecção adequada às mulheres vítimas de violência


Plano Nacional Contra a Violência doméstica


Regulamentação da legislação que garante protecção às mulheres vítimas de violência


Criação da rede pública de casas de apoio a mulheres vítimas de violência


Aprova o regime aplicável ao adiantamento pelo Estado da indemnização devida às vítimas de violência conjugal


Concretização de medidas de protecção das vítimas de violência doméstica


Aprova para ratificação a Convenção Europeia para Indemnização de Vítimas de Infracções Violentas



Ratifica a Convenção Europeia Relativa à Indemnização de Vítimas de Infracções Violentas, aberta à assinatura dos Estados membros do Conselho da Europa em Estrasburgo em 24 de Novembro de 1983


Alteração ao Código Penal e Código de Processo Penal, reforçando as medidas de protecção a pessoas vítimas de violência



Regulamenta a Lei n.º 107/99, de 3 de Agosto, que estabelece o quadro geral da rede pública de casas de apoio às mulheres vítimas de violência

Vítimas de crimes violentos


(Alterado pela Lei n.º 10/96 de 23.03 e Lei n.º 136/99 de 28.08)Estabelece o regime jurídico de protecção às vítimas de crimes violentos


(Alterado pelo Decreto-Regulamentar n.º 1/99 de 15.02)Regulamenta as condições em que o Estado indemnizará as vítimas de crimes violentos
Aviso n.º 148/97 de 10 de MaioTorna público ter Portugal assinado em 06.03.97 em Estrasburgo, a Convenção Europeia Relativa a Indemnização das Vítimas de Crimes Violentos


Altera o Decreto-Regulamentar n.º 4/93 de 22.02 que institui o funcionamento da comissão para a instrução dos pedidos de indemnização às vítimas de crimes violentos


Regulamenta o Decreto-Lei n.º 423/91 de 30.10


União de facto e economia comum


Adopta medidas de protecção das pessoas que vivam em economia comum


Adopta medidas de protecção à união de facto


Outras leis importantes


A presente lei estabelece os princípios gerais da política de saúde mental e regula o internamento compulsivo dos portadores de anomalia psíquica, designadamente das pessoas com doença mental.

Lei 10/97 de 12 de Maio

Associações de mulheres - Decreto Lei 246/98 de 11 de Agosto- Regulamenta a Lei 10/97 de 12 de Maio relativa às associações de mulheres


Cria o rendimento mínimo garantido, instituindo uma prestação do regime não contributivo da segurança social e um programa de inserção social


Regulamenta o processo de constituição e a forma de organização e de funcionamento das comissões locais de acompanhamento para o Rendimento Mínimo Garantido



PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS



A violência doméstica é um flagelo que põe em causa o próprio cerne da vida em sociedade e a dignidade da pessoa humana, razão pela qual essa problemática tem ocupado um lugar central nas preocupações do actual governo.
De facto, no ano em que se comemora o 50." ani­versário da Declaração Universal dos Direitos do Homem, o Conselho de Ministros não poderia deixar de se debruçar sobro a violência doméstica, aprovando um plano integrado e abrangente de combate a este fenómeno. Recentemente foram aprovadas várias medidas, quer de natureza legislativa, quer outras, de combate contra a violência doméstica. Estas medidas visam, em primeiro lugar, proteger as vitimas, na sua maioria mulheres, permitindo-lhes obter os meios materiais, psicológicos e físicos para se libertarem da situação de submissão em que são colocadas pelo seu agressor. Este aspecto assume particular relevância, visto que todos os tipos de violência, e a violência familiar em especial, assentam em relações de dominação e de força, que colocam a vítima numa situação que a fragiliza, limitando-a na sua capacidade de autodeterminação.
Saliente-se, apenas a título de exemplo, a regulamentação e execução das medidas previstas na Lei nº 61/91, de 13 de Agosto, tendo chegado agora o momento de definir um conjunto de medidas o objectivos mais ambiciosos.
Portugal fica, assim, dotado de um programa que, de forma integrada e coerente, congrega um conjunto de medidas a adoptar a vários níveis (justiça, administração interna, educação, saúde, entre outras), seguindo a orientação que tem presidido à elaboração dos mais recentes documentos Internacionais sobre esta matéria adoptados pela Organização das Nações Unidas e pelo Conselho da Europa. Efectivamente, com a aprovação deste plano, o Estado Português acerta o passo com a Europa e os mais recentes desenvolvimentos nesta matéria. Aliás, nas recomendações aprovadas na Con­ferência Coloria, em 30 de Março, exortam-se os Estados a aprovar planos globais do combato à violência doméstica, particularmente sobre as mulheres.
Refira-se ainda que o Governo Português irá acentuar a canalização de fundos, quer nacionais, quer europeus, designadamente através do Programa DAPHNE, para a resolução do problema da violência domestica e para a protecção das suas vítimas, procurando, sempre que possível, envolver organizações não governamentais neste complexo desígnio.
A eliminação da violência doméstica, objectivo primordial da aprovação e desenvolvimento das medidas constantes do plano, é um factor indispensável à constituição de uma sociedade verdadeiramente democrática, assente nos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da justiça como pilares fundamentais de um Estado de direito democrático
Assim:Nos lermos da alínea g) do artigo 199." da constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 — Aprovar o plano nacional contra a violência doméstica, cm anexo presente resolução e que dela faz parte integrante.
2 — Atribuir ao Alto-Comissário para as Questões da Promoção da Igualdade o da Família

39 mulheres portuguesas assassassinadas pelos maridos ou companheiros em 2006

Trinta e nove mulheres portuguesas foram mortas em 2006 pelos maridos ou companheiros e outras 43 ficaram gravemente feridas, segundo um estudo hoje apresentado em Lisboa pela presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género.
O documento foi divulgado durante um seminário do Conselho da Europa, a decorrer em Lisboa, e que abordará a recolha de dados como um requisito para políticas eficazes de combate à violência contra as mulheres, incluindo a doméstica.
Este é o terceiro de cinco seminários integrados na campanha do Conselho da Europa para combater a violência contra as mulheres lançada em Novembro, em Madrid.Arménia, Chipre, Geórgia, Itália, Malta, São Marino, Eslováquia e Ucrânia foram os países convidados para participar no encontro.
Segundo a presidente da Comissão para a Igualdade, Elza Pais, nos últimos seis anos (entre 2000 e 2006) o número de ocorrências de violência doméstica registadas pelas forças de segurança quase duplicou, passando dos 11.162 para 20.595.
Contudo, para os peritos este indicador não deverá corresponder a um aumento da violência, mas a uma maior visibilidade do fenómeno levando assim ao crescimento das denúncias.
Os dados hoje revelados indicam que 87 por cento das vítimas de violência doméstica em 2006 eram do sexo feminino e 13 por cento do sexo masculino.
Por outro lado, no quadro da violência doméstica, o estudo faz um retrato do homicídio conjugal em Portugal indicando que só no ano passado 39 mulheres morreram e outras 43 ficaram gravemente feridas.
Ainda no âmbito do homicídio conjugal, que representa 16,4 por cento do homicídio geral, o documento revela que em 2006 foram condenadas a cumprir pena de prisão 212 pessoas com idades entre os 21 e os 51 anos, de nacionalidade portuguesa.
Segundo Elza Pais, diversos estudos internacionais sugerem que muitas das mortes de mulheres são cometidas em contactos de violência conjugal. Pesquisas feitas na Austrália, Canadá, Israel, África do Sul e Estados Unidos, adianta, demonstram que 40 a 70 por cento das mulheres assassinadas anualmente foram mortas pelos maridos ou namorados em contextos de violência conjugal.
Nos Estados Unidos, por exemplo, aproximadamente um em cada três homicídios de mulheres são de natureza conjugal, enquanto no Reino Unido cerca de 120 mulheres são mortas por ano pelo cônjuge ou companheiro.
Em Espanha, cerca de 100 mulheres são mortas pelos seus actuais ou ex-companheiros em cada ano estimando-se que, por semana, uma mulher espanhola morra nas mãos do seu companheiro.
Em muitos países as "questões de honra" contribuem também para a morte de muitas mulheres e em diversas sociedades a "honra" de um homem está directamente relacionada com a "pureza" da mulher da família.
No encontro de hoje, Mendes Bota, vice-presidente do Comité para a Igualdade entre Mulheres e Homens da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, revelou que pelo menos 80 milhões de mulheres dos países da comunidade europeia já sofreram de violência doméstica.
O fenómeno, adiantou, tem custos efectivos na ordem dos 34 biliões de euros por ano equivalentes a 555 euros per capita. Segundo Mendes Bota, Portugal tem feito um percurso exemplar no combate e prevenção do problema, mas ainda não foi suficiente para travar o número de mortes anuais.
Um dos objectivos da campanha do Conselho da Europa, que tem como lema "tudo começa com um grito e nunca deve acabar num grande silêncio", é sensibilizar para o problema dando voz às mulheres que não têm voz, referiu.
Em discussão no seminário de hoje esteve a necessidade de ser feita uma harmonização na recolha de dados dos vários países de forma a permitir uma analise comparativa.
Hilary Fisher, presidente da Task Force do Conselho da Europa para combater a violência contra as mulheres, explicou que a recolha de dados fiáveis é um dos grandes desafios.
"É necessário e essencial ter dados comparáveis a nível internacional. Não basta a recolha. Há que estabelecer uma ponte directa", disse.
Fonte: Lusa (5 de Julho de 2007

Violência começa no namoro


Engane-se quem pensa que a violência nas relações íntimas é coisa de casamento, com o homem a subjugar a mulher. As novas gerações provam o contrário e começam a agredir-se mutuamente já na adolescência. Chegam ao ponto de insultar, ameaçar e até esbofetear, o que constitui um alerta de risco para a violência marital. O problema está a ser alvo de estudo a nível nacional e, inclusive, uma psicóloga quer implementar um programa de prevenção nas escolas do País para diminuir estes comportamentos."Eles acham que dar uma bofetada é normal", diz a psicóloga Sónia Caridade, da Universidade do Minho (UM), em Braga, co-autora, com Carla Machado, do estudo nacional "Violência nas Relações Amorosas Comportamentos e Atitudes nos Jovens". No namoro, explica, as agressões são mútuas e a vítima interpreta esses actos "erradamente" como sendo de ciúme, minimizando o episódio, e crê que, com o casamento, as coisas vão mudar. "Geralmente, a violência intensifica-se", afirma. Sónia Caridade constatou alguns destes aspectos, depois de ter inquirido cerca de três mil pessoas, entre os 15 e os 25 anos, abrangendo estudantes do ensino profissional, do secundário, população universitária e, por fim, jovens que abandonaram a escolaridade. Dos 685 indivíduos até à data analisados, na zona do Porto, a rondar os 19 anos, concluiu que os alunos do ensino profissional toleram mais a violência no namoro do que os que se encontram na universidade.A maioria dos inquiridos afirma discordar da violência, mas os dados revelam que 24% deles recorrem ao abuso emocional e 22% chegam mesmo a praticar agressões físicas. Para além disso, 27% admitiram ter sido vítimas de pelo menos um acto abusivo durante o último ano, enquanto 33% confirmaram ter adoptado este tipo de condutas em relação ao parceiro. O abuso é mais tolerado pelo sexo masculino, mas diminui à medida que os estudantes avançam no seu percurso escolar. O que, segundo a psicóloga, se deve à "maior maturação decorrente da idade e aos desafios suscitados pela relação".Para a psicóloga Susana Lucas, docente no Instituto Piaget, "a imaturidade e a falta de experiência, em conjunto com os esforços de querer assemelhar-se aos adultos para dominar e controlar, podem contribuir para a manifestação de comportamentos violentos para com os outros". Considera, por isso, que "a violência é um fenómeno cultural e é fundamental quebrar o elo geracional do pai que bate na mãe e do filho que vai bater na mulher". Daí a necessidade de implementar o programa de prevenção, denominado "Dossier Intimidation", nas escolas do 2.º ciclo do Ensino Básico, em 2006. "Espera-se que o sujeito e toda a comunidade envolvente sejam capazes de detectar e/ou evitar situações potencialmente perigosas", explica. Os alunos deverão ser capazes de decidir quando não querem algo, sem que se desencadeiem sentimentos de culpa. Pretende-se identificar factores que caracterizem os adolescentes vítimas e perpetradores de violência, e elaborar um plano de medidas de intervenção comunitária. Namoros de adultos. No caso dos namorados em idade adulta, a psicoterapeuta Marlene Matos, da Unidade de Consulta em Psicologia da Justiça e Reinserção Social, da UM, diz que a agressão é semelhante à que ocorre nas relações maritais. "O agressor recorre às mesmas estratégias de vitimação, ou seja, à violência psicológica e às tentativas de controlo social da vida da vítima", explica. Seguem- -se depois as ofensas físicas e os abusos sexuais. Algumas mulheres acabam por sofrer tanto como as que já estão casadas, diferenciando-se apenas pela inexistência do vínculo do matrimónio e de filhos. Mas a ocorrência da violência no namoro deveria representar "um sinal de alarme" para as mulheres. Tanto que, nas suas consultas na UM, algumas vítimas de violência marital recordam ter tido elevada conflituosidade e maus tratos verbais na fase de namoro. Tal como no casamento, explica Marlene Matos, também no namoro "o medo da mulher é um aliado do agressor". O receio de perseguições e retaliações acaba por levá-la a render-se ao domínio do namorado, o que muitas vezes a impede de reagir mais cedo. No caso de "Maria", as constantes bofetadas e pontapés acabaram por levá-la a procurar apoio, apesar de não ter apresentado queixa na polícia. O namorado, de 21 anos, foi a uma sessão e depois o psicólogo perdeu-lhe o rasto. "Manuel", chamemos-lhe assim, identificou--se como sendo a vítima, acusando-a de o "deixar inseguro, agredir verbalmente e ser injusta" na relação. "Ela retribui o amor que tenho por ela acusando-me de várias coisas. É ingrata porque diz que me vai deixar e descontrolo-me", conta. Para o "José", licenciado, foi diferente aconselhou a "Vera" a ir à consulta, "porque achava que ela tinha um problema", mas ela abandonou-o porque ele "lhe controlava os movimentos e batia". Para saber o que se passava, José fez-se passar por utente e apresentou-se como o namorado "daquela que tinha problemas". Não negou as agressões físicas à namorada, mas disse "perder o controlo porque ela era muito ciumenta". Para o psicólogo Rui Abrunhosa, da UM, os agressores podem melhorar a atitude face à mulher. Mas, para isso, esta precisa de de-senvolver "estratégias para ser capaz de perceber quando ele está a pisar o risco".

Vamos acabar de vez com a violência




Monday, October 1, 2007

Lisboa: Homem disparou sobre a mulher e está em casa


Disparou sobre a própria mulher, levou-a até ao hospital e entregou o revólver à PSP de Belém, Lisboa. À luz da nova Lei Penal, é um homem livre. Basta que se entregue.

A vítima não morreu, mas o crime é indiferente “seja violência doméstica ou homicídio qualificado”, garantem ao CM fontes judiciais. Este crime ocorreu na semana passada e o agressor está em liberdade. Agora pode esperar dois anos em casa até ser julgado.Quando a discussão estalou entre o casal, ‘João’ (nome fictício) pôs fim à conversa com um tiro na mulher. Mas, por sorte, a bala só a atingiu num braço. O agressor apresentou-se à PSP com o revólver e, chamada uma brigada de homicídios da Polícia Judiciária, os inspectores foram confrontados com a nova lei.“Como se apresentou tem de se partir do princípio de que não há perigo de fuga” e, ao abrigo do Artigo 257.º, n.º 2, do novo Código, “o agressor não pode ser detido”. Independentemente do grave crime que cometeu, que neste caso é punível até 17 anos de cadeia: homicídio qualificado, por se tratar da mulher, apenas reduzido em um terço por a vítima não ter morrido.Desde o passado dia 15, quando o Código entrou em vigor, fica à solta quem cometer “qualquer crime” e se antecipar ao mandado de captura – “só tem de ser o próprio a apresentar-se à polícia”. É então notificado a comparecer em primeiro interrogatório judicial, “nunca antes de um mês depois”, mas fica em liberdade até ao julgamento – “sem perigo de fuga, não há prisão preventiva”. Entre inquérito, acusação e outros impasses legais, um homicida “pode passar um a dois anos em casa”.No caso de ‘João’, bastou-lhe no dia seguinte apresentar-se nos juízos de pequena instância criminal de Lisboa, onde foi julgado por posse ilegal de arma.A violência doméstica “é uma criminalidade especial, o agressor está por norma socialmente integrado e comparece voluntariamente às autoridades”. Por isso não lhe podem ser emitidos mandados de detenção e consequente afastamento de casa. Primeiro é presente ao juiz, às vezes um mês depois. Até lá fica em casa, o que pode ser fatal para a vítima .
VÍTIMA FOGE DAS AGRESSÕES E PERDE O DIREITO À CASA
O facto de o novo Código de Processo Penal não permitir ao Ministério Público afastar os agressores de casa, sempre que estes se apresentam voluntariamente às autoridades, “obriga as vítimas de violência doméstica a saírem elas próprias”, para fugirem do perigo. “Procuram abrigo na polícia, por exemplo, quando os agressores atravessam uma crise, enquanto eles ficam no mesmo sítio. E as vítimas perdem o direito à casa – depois de agredidas são novamente penalizadas”. Ou seja, o agressor é chamado às autoridades devido a uma denúncia, por um crime público que dá direito a prisão preventiva – punido de um a cinco anos de cadeia, mas com a ressalva na nova lei de ter sido englobado na criminalidade violenta. Mas, como se apresenta, não há mandado de detenção. E volta para casa. “Pelo menos um mês, até ser chamado ao juiz.” Entretanto a vítima de violência continua exposta ao perigo. Por isso, foge ela de casa. Quando o agressor chega a primeiro interrogatório judicial, o juiz já não aplica qualquer medida de afastamento: está sozinho e em casa, já não se justifica. “Tudo isto pelo facto de o agressor se apresentar voluntariamente às autoridades num crime em que, por norma, estão sempre disponíveis.”
"DIZ QUE É UMA ESPÉCIE DE REFORMA PENAL...", Plácido Conde Fernandes, vogal do Conselho Superior do Ministério Público Correio da Manhã – Concorda que a lei liberte agressores em flagrante delito e um homicida que se apresente à polícia voluntariamente?
Plácido Conde Fernandes – Com algumas precisões esta é a nova realidade. Dizia ontem o prof. Costa Andrade no CM serem anedóticos alguns aspectos dos prazos para a entrada em vigor. Passado o ‘terramoto’ da libertação de muitos presos preventivos a cumprir penas pesadas preocupam-me mais as ‘réplicas’ que estão para vir.– Este é um desses casos?– Sim, porque sempre que os tribunais estejam fechados esta reforma falha e “diz que é uma espécie” de equilíbrio entre os direitos das vítimas e dos arguidos. Os aspectos anedóticos são mais trágicos do que cómicos. – Como assim?– Uma patrulha da PSP presencia uma violenta agressão do marido à mulher e afasta-o. A mulher pergunta aos agentes: “O crime admite prisão preventiva? Sim. Afastamento do agressor? Sim. Proibição de contactos comigo? Também. Neste caso, em que o perigo é que as agressões continuem? Sim. É o juiz de instrução que aplica estas medidas. E agora vão detê-lo? Sim, mas não fica detido por não termos suspeitas que fuja. Temos que o libertar. Então, como pode a polícia apresentá-lo ao juiz? Não pode. Que vão fazer? Notificamo-lo para ir a tribunal no próximo dia útil. Talvez o Ministério Público possa emitir uns mandados de detenção? Não pode. Ou talvez o juiz possa mandar detê-lo? Também não pode. E se faltar? Logo se vê. O crime não admite até prisão preventiva? Admite. Mas a polícia não pode levar o agressor ao juiz? Não pode. Libertá-lo é perigoso para a vítima? É. Mas não pode ser mantido detido? Não pode.” Podia continuar – Como é possível não terem acautelado estas situações?– Ter-se-á querido acabar com as detenções-espectáculo que assistimos em casos mediáticos. É uma má transposição do parágrafo 127.º do CPP alemão. O problema dos slogans a partir de casos concretos é que não se aplicam à generalidade das situações. Há mais motivos, além do perigo de fuga, para que alguém seja presente ao juiz.– O que propõe?– Devem ser alterados os artigos 257.º/1 e 385.º/1 ou criadas outras normas, em leis avulsas como a nova de segurança interna, para acautelar crimes em execução ou com perigo de continuação actividade criminosa.
OS NÚMEROS DO CRIME- 194 foi o número de homicídios voluntários consumados que as autoridades policiais registaram no ano passado. Um aumento de vinte por cento em comparação com 2005.- 39 mulheres morreram em 2006 em Portugal vítimas de violência doméstica, segundo um relatório da Amnistia Internacional publicado em Maio último.- 14 232 ocorrências de maus tratos a cônjuges registadas pelas autoridades no ano passado. Serão a maioria das queixas por agressões apresentadas.- 80 milhões de euros serão investidos até 2013 contra a discriminação e a exclusão sociais, projectos que têm como objectivo a protecção de mulheres vítimas de violência e crianças.- 360 milhões de euros por ano são os custos suportados pela economia portuguesa pelos dias de baixa a que ficam sujeitas as vítimas de violência doméstica.- 4330 novos processos registados pela Associação Portuguesa de Apoio à Vítima durante o primeiro semestre deste ano. Lisboa, com 1359 casos, representa 31,4 por cento das ocorrências.- 87% das vítimas são mulheres com idades entre os 26 e os 45 anos. O agressor, também em 87 por cento dos casos é homem e tem entre 26 e 55 anos.- 86% por cento dos crimes cometidos são de violência doméstica, na qual os maus tratos físicos e psicológicos assumem papel de destaque.